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domingo, 20 de novembro de 2016

A Posição Eclesiástica e Secular de Gregório

O cuidado pastoral da igreja era evidentemente o principal objetivo e deleite do coração de Gregório. Ele acreditava que esta era sua obra, e com prazer teria se dedicado inteiramente a isto; pois, de acordo com a credulidade supersticiosa da época, ele tinha a mais profunda convicção de que o cuidado e governo de toda a igreja pertencia a ele como sucessor de São Pedro; e também, que ele era obrigado a defender a dignidade especial da Sé de Roma. Mas ele foi compelido, a partir do perturbado estado da Itália, e pela segurança de seu povo -- seu querido rebanho -- a empreender muitos tipos de negócios incômodos, totalmente estranhos ao seu chamado espiritual. Os invasores lombardos* eram, naquela época, o terror dos italianos. Os godos tinham sido, em grande medida, civilizados e romanizados. Mas esses novos invasores eram bárbaros sem remorso e impiedosos; embora, por mais estranho que seja dizê-lo, eles eram os autodeclarados campeões do arianismo. E o poder imperial, em vez de proteger seus súditos italianos, agiu apenas como um obstáculo para que eles se defendessem. Guerra, fome e pestilência tinham dizimado e despopulado tanto o país, que todos os corações falhavam, e todos se voltavam ao bispo como o único homem para a emergência desses tempos, de tão firme que era a opinião sobre sua integridade e capacidade entre os homens.

{* Os lombardos foram uma tribo germânica de Brandenburg. De acordo com a crença popular, eles tinham sido convidados à Itália por Justiniano para lutar contra os godos. O chefe deles, Alboin, estabeleceu um reino que durou de 568 a 774. O último rei, Desidério, foi destronado por Carlos Magno. Como os encontraremos novamente em conexão com nossa história, apenas tomamos esta breve nota sobre sua origem. -- Dicionário de Datas, de Haydn.}

Assim vemos que o poder secular, em primeira instância, foi imposto ao Papa. Não parece que ele buscava essa posição -- uma posição tão ansiosamente procurada por muitos de seus sucessores; mas vemos que ele entrou com relutância em deveres tão pouco de acordo com o grande objetivo de sua vida. Ele involuntariamente deixou para trás a vida quieta e contemplativa de monge, e entrou em assuntos do estado como um dever a Deus e a seu país. A direção dos interesses políticos de Roma recai sobretudo sobre Gregório. Ele foi guardião da cidade e o protetor da população da Itália contra os lombardas. Toda a história presta testemunho à sua grande capacidade, sua incessante atividade, e a multiplicidade de suas ocupações como o virtual soberano de Roma.

No entanto, por mais inconsciente que Gregório tenha sido quanto aos efeitos de sua grande reputação, ele contribuiu muito para a dominação eclesiástica e secular de Roma. A preeminência em seu caso, por mais triste que fosse para um cristão, era desinteressada e exercida de modo benéfico; mas não foi assim com seus sucessores. A infalibilidade do Papa, a tirania espiritual, a perseguição aos de diferentes opiniões, a idolatria, a doutrina do mérito das obras, o purgatório e as missas pelas almas dos mortos, coisas que se tornaram marcas registradas do papado, ainda não haviam se estabelecido totalmente em Roma; mas, podemos dizer, estavam todas à vista.

Não devemos, no entanto, prosseguir com esse assunto no momento; voltemos a um assunto mais interessante e mais agradável a nossas mentes.

domingo, 6 de novembro de 2016

Leão I, Apelidado de "O Grande"

Podemos prosseguir, sem interrupção, do nome de Inocêncio para o de Leão, que ascendeu à cadeira de São Pedro no ano 440, e a ocupou por 21 anos. Ele era notável por suas habilidades políticas, erudição teológica e grande energia eclesiástica. Ele sustentava, com a arrogância de romano e com o zelo de clérigo, que todas as pretensões e todas as práticas em sua igreja eram questões para a contínua sucessão apostólica. Contudo, parece que ele era firme na fé quanto à salvação, e zelosamente oposto a todos os hereges. As igrejas orientais tinham perdido o respeito da Cristandade pelas suas longas e vergonhosas controvérsias. Poder, e não sutilezas, era a ambição de Roma. Leão condenou toda a raça de hereges, desde Ário a Eutiques; mas mais especialmente a heresia maniqueísta.

Por seus grandes esforços e extraordinário gênio ele levantou as reivindicações do bispo romano como sendo o representante de São Pedro a uma altura nunca antes vista. "O apóstolo", diz ele, "foi chamado Petra, a pedra, por cuja denominação ele é constituído o fundamento... Em sua cadeira habita a sempre viva, a super-abundante, autoridade. Que os irmãos, portanto, reconheçam que ele é o primaz de todos os bispos, e que Cristo, que não nega a ninguém seus dons, ainda assim não os concede a ninguém exceto por meio dele."*

{* Cathedra Petri, de Greenword, vol. 1, p. 348.} 

Tomando devida consideração pelo caráter dos tempos e pelas opiniões oficiais e inerentes, cremos que Leão era sincero em suas convicções, e provavelmente um cristão. De coração ele cuidava do povo de Deus, e mais de uma vez, por suas orações e sagacidade política, salvou Roma dos bárbaros. Quando Átila, o mais terrível dos conquistadores estrangeiros, com suas incontáveis hostes, pairava sobre a Itália, pronto para cair sobre a indefesa capital, Leão foi adiante o "Destruidor" no nome do Senhor, e como o chefe espiritual de Roma, e tão fervorosamente orou por seu povo que as paixões selvagens do huno se acalmaram e, para espanto de todos, ele concordou com os termos pelos quais a cidade foi salva do caos e abate. Mas o principal objetivo da vida de Leão, e a que ele cumpriu plenamente, foi estabelecer as bases da grande monarquia espiritual de Roma. Durante seu pontificado ele foi o nome mais conhecido no império, se não em toda a Cristandade. Ele morreu no ano 461.

As Vantagens de Roma

A corte de Constantinopla, embora possa ter encorajado as esperanças e ambições dos bispos, afetava o governo da igreja com poder despótico, e decidia em controvérsias religiosas do tipo mais grave. Mas no Ocidente não era assim. O pontífice romano desse período demonstrou o espírito independente e agressivo do papado que se elevou a tais alturas em épocas posteriores. Os bispos do Oriente foram assim colocados em desvantagem em consequência de sua dependência da corte e de suas disputas com os imperadores. Além disso, a presença e grandeza do soberano oriental mantinha a dignidade do bispo em um lugar secundário. Em Roma não havia mais ninguém para disputar com a classe ou estilo do pontífice.

A retirada dos imperadores de Roma, como residência real, foi então favorável ao desenvolvimento do poder eclesiástico ali; pois, embora abandonada por seus governantes, era ainda venerada como a verdadeira capital do mundo. Deste modo, Roma possuía muitas vantagens como a sede do bispo supremo. Mas o fator principal que impulsionou e consolidou o poder da Sé romana foi a crescente crença, por toda a Cristandade, de que São Pedro foi seu fundador. Os bispos romanos negavam que sua precedência originava-se na grandeza imperial da cidade, mas sim em sua descendência linear de São Pedro. Este dogma foi geralmente recebido por volta do começo do século V.

Por tais argumentos a igreja de Roma estabeleceu seu direito de governar a universal igreja. Ela sustentava que Pedro era primaz entre os apóstolos, e que seu primado é herdado pelos bispos de Roma. Mas pode ser interessante observar aqui o duplo aspecto do romanismo -- o eclesiástico e o político. Em ambos os aspectos ele reivindicava a supremacia. Eclesiasticamente ele sustentava: (1) que o bispo de Roma é o juiz infalível em todas as questões de doutrina; (2) que ele tem o direito inerente ao governo supremo em convocar concílios gerais e presidir sobre eles; (3) que o direito de fazer nomeações eclesiásticas pertencia a ele; (4) que a separação da comunhão da igreja de Roma envolve a culpa de cisma. Politicamente ela reivindicava, aspirava e ganhava preeminência e poder sobre toda a sociedade européia, assim como sobre todos os governos europeus. Veremos provas abundantes desses fatores em particular no decorrer de sua bem definida história, a qual daremos prosseguimento agora.

Não foi até depois do primeiro concílio de Niceia que a supremacia dos bispos romanos passou a ser, em geral, permitida. Os primeiros bispos de Roma mal são conhecidos na história eclesiástica. A ascensão de Inocêncio I no ano 402 deu força e definição a esse novo princípio da igreja latina. Até este tempo não havia qualquer reconhecimento legal da supremacia de Roma, embora ela fosse considerada a principal igreja do Ocidente, e fosse frequentemente procurada pelos outros grandes bispos por um julgamento espiritual em questões de disputa. Quando a igreja grega caiu no arianismo, a igreja latina aderiu firmemente ao credo niceno {*N. do T.: a doutrina da Santíssima Trindade defendida no concílio de Niceia, em oposição à doutrina do arianismo}, o que a elevou muito na opinião de todo o Ocidente. "Na mente de Inocêncio", diz Milman, "parece ter surgido, pela primeira vez, a vasta concepção da supremacia eclesiástica universal de Roma; ainda sombria e escura, mas completa e abrangente em seu esboço."

sábado, 15 de agosto de 2015

Paulo em Mileto

O estágio mais importante dessa jornada é Mileto, embora os diferentes lugares em que eles passam sejam cuidadosamente notados pelo historiador sagrado. Paulo, estando cheio do Espírito, dá direções para a viagem. Seus companheiros, de bom grado, lhe obedecem, mas não como a um mestre, mas como a um que dirige na humildade do amor e na sabedoria de Deus. Ele decide não ir a Éfeso, embora fosse um lugar central, pois ele tinha o propósito no coração de ir a Jerusalém no dia de Pentecostes. Mas, como o navio viria a ser detido algum tempo em Mileto, ele envia uma carta aos anciãos da igreja em Éfeso para poderem se encontrar. Dizem que a distância entre os dois lugares é de cerca de 48 quilômetros, de modo que levaria dois ou três dias para ir e voltar. Mesmo assim, tiveram tempo suficiente para se reunirem antes do navio sair. Assim o Senhor pensa em Seus servos e faz com que todas as coisas cooperem para o bem e para Sua própria glória.
O discurso de despedida de Paulo aos anciãos de Éfeso é característico e representativo, exigindo nosso mais cuidadoso estudo. Ele põe diante de nós a profunda e tocante afeição do apóstolo, a posição da igreja naquele tempo, e a obra do evangelho entre as nações. Ele os exorta com incomum seriedade e ternura; ele sentia que estava se dirigindo a eles pela última vez; ele os lembra de seus trabalhos entre eles "servindo ao Senhor com toda a humildade, e com muitas lágrimas" (Atos 20:19). Ele os adverte contra os falsos mestres e heresias - os lobos cruéis que entrariam no meio deles, e os homens amantes de si mesmos que se ergueriam, falando coisas perversas, para atraírem os discípulos após si. "E, havendo dito isto, pôs-se de joelhos, e orou com todos eles. E levantou-se um grande pranto entre todos e, lançando-se ao pescoço de Paulo, o beijavam, entristecendo-se muito, principalmente pela palavra que dissera, que não veriam mais o seu rosto. E acompanharam-no até o navio." (Atos 20:36-38)

Como este pensamento sobre Paulo é da mais elevada importância, e marca uma época distinta na história da igreja, além de lançar luz divina sobre todos os sistemas eclesiásticos, podemos citar um pensamento abrangente e compreensivo de outro autor:

"A igreja estava consolidada sobre uma extensa área do território, e em vários lugares tinha tomado a forma de uma instituição comum. Anciãos eram estabelecidos e reconhecidos. O apóstolo podia chamá-los para ter com ele. Sua autoridade era também reconhecida por parte deles. Ele fala de seu ministério como algo passado - solene pensamento!... Assim, o que o Espírito Santo coloca diante de nós é que, agora, quando os detalhes de sua obra entre os gentios de plantar o evangelho são relatados como um panorama entre judeus e gentios, ele diz adeus ao trabalho. Isto para que pudesse deixar aqueles que ele havia reunido em uma nova posição e, em certo sentido, entregues a si mesmos. É um discurso que marca a cessação de uma fase da igreja - a dos trabalhos apostólicos - e a entrada de uma outra: a responsabilidade da igreja de manter-se firme agora que esses trabalhos tinham cessado; o serviço dos anciãos, a quem 'o Espírito Santo constituiu supervisores (bispos)' (Atos 20:28); e, ao mesmo tempo, os perigos e dificuldades que se seguiriam após o fim dos trabalhos apostólicos, complicando o trabalho dos anciãos, a quem a responsabilidade recairia especialmente.

"A primeira observação que decorre da consideração deste discurso é que a sucessão apostólica é inteiramente negada. Devido à ausência do apóstolo, várias dificuldades surgiriam, e não haveria ninguém em seu lugar para lidar ou prevenir estas dificuldades. Sucessor, portanto, ele não tinha. Em segundo lugar, parece que o fato de que esta energia, que freava o espírito do mal, uma vez que estivesse longe, faria erguer as cabeças dos lobos devoradores vindos de fora, e dos mestres de coisas perversas vindos de dentro, que atacariam a simplicidade e a felicidade da igreja. Esta seria assediada pelos esforços de satanás, uma vez que não possuía mais a energia apostólica para resistir-lhes. Em terceiro lugar, o que de primordial deveria ser feito para o impedimento do mal era alimentar o rebanho, e vigiar, quer sobre si mesmos ou sobre o rebanho, para aquele propósito. Ele então os encomenda - nem a Timóteo nem a algum bispo, mas de um modo que deixa de lado qualquer tipo de recurso oficial - a Deus e à palavra de Sua graça. Nesse ponto ele deixa a igreja. Os trabalhos em liberdade do apóstolo dos gentios estavam terminados. Ele tinha sido o instrumento escolhido de Deus para comunicar ao mundo Seus conselhos a respeito da igreja e para estabelecer na mente do mundo o precioso objeto de Suas afeições, unida a Cristo à Sua mão direita. O que seria dela aqui?" *

{* The Present Testemony [O Atual Testemunho], v. 8, p. 405-407.}

Atos 21. Com um vento justo, Paulo e sua companhia partiam de Mileto, enquanto os entristecidos anciãos de Éfeso se preparavam para sua viagem de volta. Em um curso reto eles velejaram a Cós, Rodes, e daí até Pátara e Tiro. A partir do que aconteceu lá - tão similar ao que houve em Mileto - é evidente que Paulo logo conquistou o coração dos discípulos. Embora ele tenha ficado apenas uma semana em Tiro, não conhecendo os cristãos dali, ele tinha ganhado suas afeições. "E seguimos nosso caminho, acompanhando-nos todos", diz Lucas, "com suas mulheres e filhos até fora da cidade; e, postos de joelhos na praia, oramos." (Atos 21:5). Parece também que um espírito de profecia foi derramado sobre esses afetuosos cristãos de Tiro, pois eles advertiram o apóstolo para que não fosse a Jerusalém. Após esperar ali por sete dias, foram a Ptolemaida, onde ficaram por um dia. Em Cesareia, ficaram hospedados na casa de Filipe, o evangelista, que era um dos sete. Ele também já é bem conhecido nosso, mas é interessante encontrá-lo novamente após um intervalo de mais de vinte anos. Agora ele tem quatro filhas virgens que profetizavam. Aqui Ágabo, o profeta, previu o aprisionamento de Paulo, e rogou-lhe que não fosse a Jerusalém. Todos os discípulos disseram o mesmo, e suplicavam-lhe com lágrimas para que não fosse. Mas embora o coração terno e sensível de Paulo deva ter se movido pelas lágrimas e suplicas de seus amigos e de seus próprios filhos na fé, ele decidiu não alterar sua resolução e não deixar de lado seu propósito. Ele se sentiu compelido em espírito a ir, e pronto a deixar todas as consequências à vontade do Senhor.

sábado, 6 de setembro de 2014

O Apostolado de Paulo

A lei e os profetas foram até João; após João o próprio Senhor, em Sua própria Pessoa, oferece o reino a Israel, mas "os Seus não O receberam". Eles crucificaram o Príncipe da vida, mas Deus O ressuscitou dentre os mortos, fazendo-O sentar à Sua direita nos lugares celestiais. Temos então os doze apóstolos. Eles são dotados com o Espírito Santo, e levam o testemunho da ressurreição de Cristo. Mas o testemunho dos doze é desprezado, o Espírito Santo é resistido, Estêvão é martirizado, a oferta final de misericórdia é rejeitada, e agora o tratamento de Deus com Israel como um povo é encerrado por um tempo. As cenas de Siló são encenadas novamente, Icabode é escrito em Jerusalém, e uma nova testemunha é convocada, como nos dias de Samuel. (Leia 1 Samuel 4)

Chegamos agora ao grande apóstolo dos gentios. Ele é como um nascido fora do tempo e fora de seu devido lugar. Seu apostolado não tinha nada a ver com Jerusalém ou com os doze. Era fora de ambos. Seu chamado era extraordinário e vindo direto do Senhor no Céu. Ele tem o privilégio de trazer a novidade: o caráter celestial da igreja - que Cristo e a igreja são um, e que o Céu é seu lar em comum (Efésios 1,2). Enquanto Deus estava tratando com Israel, essas benditas verdades estavam guardadas em segredo em Sua própria mente. "A mim,", diz Paulo, "o mínimo de todos os santos, me foi dada esta graça de anunciar entre os gentios, por meio do evangelho, as riquezas incompreensíveis de Cristo, e demonstrar a todos qual seja a dispensação do mistério, que desde os séculos esteve oculto em Deus, que tudo criou por meio de Jesus Cristo." (Efésios 3:8-9)

Não podia haver dúvidas sobre o caráter do chamado do apóstolo quanto à sua autoridade divina. "Não da parte dos homens, nem por homem algum", como diz ele em sua Epístola aos Gálatas, "mas por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os mortos" (Gálatas 1:1). Isto é,  não era "da parte dos homens", quanto à sua fonte, nem de qualquer Sínodo* de homens oficiais. "Nem por homem algum", foi como veio sua comissão. Ele não era apenas um santo, mas um apóstolo por chamado: e esse chamado era por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que O ressuscitou dentre os mortos. Em alguns aspectos, seu apostolado foi ainda de mais alta ordem do que o dos doze. Estes tinham sido chamados por Jesus quando na Terra; aquele tinha sido chamado pelo Cristo ressuscitado e glorificado no Céu. E, sendo seu chamado vindo do Céu, não necessitava nem da sanção nem do reconhecimento dos outros apóstolos. "Mas, quando aprouve a Deus ... revelar seu Filho em mim, para que o pregasse entre os gentios, não consultei a carne nem o sangue, nem tornei a Jerusalém, a ter com os que já antes de mim eram apóstolos, mas parti para a Arábia, e voltei outra vez a Damasco." (Gálatas 1:15-17)

A forma como Saulo foi chamado para apóstolo é digna de nota especial, pois bate de frente com a raiz do orgulho judaico, e pode também ser vista como o golpe mortal à vã noção de sucessão apostólica. Os apóstolos, a quem o Senhor tinha escolhido e nomeado quando estava na Terra, não eram nem a fonte nem o canal, de maneira alguma, da nomeação de Paulo. Eles não lançaram sortes para ele, como fizeram no caso de Matias (Atos 1). Ali eles estavam apenas em terreno judeu, o que pode explicar sua decisão por sorteio. Era um antigo costume, em Israel, descobrir a vontade divina por esses modos. Mas estas enfáticas palavras: "Paulo, apóstolo, não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por Jesus Cristo", excluem completamente a intervenção do homem sob qualquer forma. A sucessão apostólica é descartada. Somos santos por chamado e servos por chamado. E tal chamado deve vir do Céu. Paulo está diante de nós como um verdadeiro padrão para todos os pregadores do evangelho, e para todos os ministros da Palavra. Nada pode ser mais simples que o terreno que ele toma como pregador, sendo o grande apóstolo que era. "E temos, portanto, o mesmo espírito de fé, como está escrito: Cri, por isso falei; nós cremos também, por isso também falamos." (2 Coríntios 4:13)

Imediatamente após ser batizado e fortalecido, ele começou a confessar sua fé no Senhor Jesus e a pregar nas sinagogas de que Ele era o Filho de Deus. Isto é algo novo. Pedro pregava que Ele tinha sido exaltado à destra de Deus - que Ele tinha sido feito tanto Senhor quanto Cristo, mas Paulo prega uma doutrina mais elevada sobre Sua glória pessoal - "que Ele é o Filho de Deus". Em Mateus 16, Cristo é revelado pelo Pai aos discípulos como "o Filho do Deus vivo". Mas agora Ele é revelado, não apenas a Paulo, mas em Paulo. "Aprouve a Deus ... revelar seu Filho em mim" (Gálatas 1:15-16), disse ele. Mas quem é suficiente para falar dos privilégios e bênçãos daqueles a quem o Filho de Deus é, pois, revelado? A dignidade e segurança da igreja descansa sobre essa bendita verdade, e também sobre o evangelho da glória, que foi especialmente confiado a Paulo, e que ele chama de "meu evangelho".

"Sobre o Filho assim revelado", disse alguém docemente, "paira tudo o que é peculiar ao chamado e glória da igreja - suas santas prerrogativas - aceitação no Amado com perdão dos pecados por meio de Seu sangue - entrada para os tesouros da sabedoria e do conhecimento, de modo a tornar conhecido, a nós, o mistério da vontade de Deus - herança futura nEle e com Ele, no qual todas as coisas nos céus e na Terra serão congregadas - e o presente selo e penhor dessa herança, o Espírito Santo. Tal brilhante sequência de privilégios é escrita pelo apóstolo desta maneira: "bênçãos espirituais nos lugares celestiais"; e assim são elas; bênçãos através do Espírito fluindo e nos ligando a Ele, que é o Senhor nos céus." * (Efésios 1:3-14)

{* Veja mais detalhes sobre esse assunto em John Gifford Bellet, Christian Witness [Testemunho cristão], v. 4, p. 221; William Kelly, Introductory Lectures on Galatians [Estudos introdutó­rios sobre Gálatas], cap. 1}

Mas a doutrina da igreja - o mistério do amor, da graça e do privilégio - não tinha sido revelada até Paulo a ter declarado. O Senhor tinha falado dela quanto ao efeito que teria a presença do Consolador, dizendo: "Naquele dia conhecereis que estou em meu Pai, e vós em mim, e eu em vós." (João 14:20). E novamente, quando Ele diz aos discípulos após a ressurreição: "Eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus." (João 20:17). Dessa "sequência brilhante" de bênçãos Paulo foi, especial e caracteristicamente, o apóstolo.

Devemos agora deixar um pouco de lado a história de Saulo e voltar a Pedro, que ocupa o campo até que Paulo comece seu ministério público em Atos 13.

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