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segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Traduções Parciais

A primeira tentativa de algo parecido com uma tradução vernácula de uma parte das sagradas escrituras parece ter sido realizada no século VII. Até este período, elas estavam disponíveis apenas na língua latina na Inglaterra, e, estando principalmente nas mãos do clero, o povo em geral recebia o que sabia da revelação de Deus por meio da instrução deles. Mas, como a maioria dos padres não sabia nada mais do que o que eram obrigados a repetir no culto da igreja, as pessoas ficaram em total escuridão.

O venerável Beda menciona um poema em língua anglo-saxônica, que leva o nome de Caedmon, que fornece com fidelidade tolerável algumas das partes históricas da Bíblia; mas, devido ao seu caráter épico, não foi classificado com as versões dos escritos sagrados. Mesmo assim, foi o início desta obra abençoada, pela qual podemos ser verdadeiramente gratos. Pode ter dado a ideia a outros mais competentes e sido o precursor de traduções reais.

No século VIII, Beda traduziu o credo dos apóstolos e a oração do Senhor para o anglo-saxão, que ele frequentemente apresentava a padres analfabetos: e um de seus últimos esforços foi uma tradução do Evangelho de São João, que supõe-se ser a primeira parte do Novo Testamento que foi traduzida para a língua vernácula do país. Ele morreu em 735.

O rei Alfredo, em seu zelo pelo aprimoramento de seu reino, não negligenciou a importância das escrituras vernáculas. Com a ajuda dos sábios de sua corte, ele mandou traduzir os quatro Evangelhos. E Elfrico, no final do século X, havia traduzido alguns livros do Antigo Testamento. Por volta do início do reinado de Eduardo III, Guilherme de Shoreham traduziu o Saltério para a língua anglo-normanda; e ele foi logo seguido por Ricardo Rolle, padre da capela em Hampole. Ele não apenas traduziu o texto dos Salmos, mas acrescentou um comentário em inglês. Ele morreu em 1347. O Saltério parece ser o único livro das escrituras que foi totalmente traduzido para o inglês antes da época de Wycliffe. Mas era chegado o momento na providência de Deus para a publicação de toda a Bíblia e para sua circulação entre o povo. Cada circunstância, apesar do inimigo, foi anulada por Deus para favorecer o nobre desígnio de Seu servo.

Tendo recebido muitos avisos, muitas ameaças, e experimentado algumas fugas por um triz da masmorra repugnante e da pilha em chamas, foi permitido a Wycliffe encerrar seus dias em paz, no meio de seu rebanho e seus trabalhos pastorais em Lutterworth. Depois de quarenta e oito horas de doença devido a um ataque de paralisia, ele morreu no último dia do ano de 1384.*

{* Para maiores detalhes sobre as primeiras traduções para o inglês, consulte o prefácio da Bíblia de Wycliffe, editada pelo Rev. Josiah Forshall e Sir Frederick Madden, ambos do Museu Britânico. É um livro nobre, in-fólio de quatro volumes, impresso na University Press, Oxford, e um nobre monumento ao zelo e devoção cristã, sob a proteção da mão de Deus. Veja também o prefácio de English Hexapla, de Bagster.}

domingo, 29 de julho de 2018

O Culto a Maria

A adoração à Virgem Maria originalmente nasceu do espírito ascético que tornou-se prevalente no século IV. Antes desse período, não há registros de adoração a Maria. Por volta da mesma época -- o final do século IV -- foi descoberto e circulava a ideia de que havia, no templo em Jerusalém, virgens consagradas a Deus, dentre as quais Maria cresceu e fez votos de virgindade perpétua. Essa nova doutrina levou à veneração de Maria como o próprio ideal do estado celibatário, e sancionou a profissão da castidade religiosa. Pouco tempo depois, tornou-se costume aplicar à virgem a designação de "Mãe de Deus", o que deu origem à controvérsia nestoriana. Mas, apesar da toda a oposição, a adoração a Maria prevaleceu; e, no século V, imagens e belas pinturas da virgem segurando o menino Jesus em seus braços foram colocadas em todas as igrejas. Assim introduzidas, elas rapidamente tornaram-se um objeto de adoração direta, e a mariolatria tornou-se a paixão governante da igreja romana. O serviço diário de devoção a Maria, e os dias e festivais que foram dedicados a sua honra, foram confirmados por Urbano II no Concílio de Clermont, em 1095.

A reverência pela bendita virgem tornou-se, então, uma doutrina e prática estabelecida na igreja de Roma, e assim continua até os dias atuais. Os romanistas podem negar que honram Maria com a adoração devida somente a Deus, mas em seus livros de devoção, orações à virgem ocupam um lugar de proeminência. Nenhuma oração, cremos, é de uso tão constante quanto o "Ave Maria", na qual, após a citação de uma passagem da saudação do anjo Gabriel à virgem, acrescentam-se as palavras: "Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós os pecadores, agora e na hora de nossa morte, Amém". Novamente, em outra oração, a virgem é assim invocada: "À vossa proteção recorremos, Santa Mãe de Deus; não desprezeis as nossas súplicas em nossas necessidades; mas livrai-nos sempre de todos os perigos, ó Virgem gloriosa e bendita". Outra diz assim: "Salve-Rainha, Mãe de misericórdia, vida, doçura e esperança nossa, Salve! A vós bradamos, os degredados filhos de Eva; a vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas. Ela, pois, advogada nossa, esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei", e assim por diante. Ela também é chamada de "Arca da Aliança", "Porta do Céu", "Estrela da Manhã", "Refúgio dos Pecadores", e muitos outros termos semelhantes, que mostram claramente o lugar de idolatria que Maria ocupa nas devoções da igreja católica.*

{* Para detalhes, veja "Mariolatry" em Faiths of the World, de Gardner, vol. 2, p. 372. E Vidas dos Santos, de Butler -- o grande livro católico romano sobre esse assunto. }

O Rosário, isto é, uma série de orações acompanhadas de um colar de contas (pequenas esferas) pelas quais as orações são contadas, consiste em quinze dezenas. Cada dezena contém dez Ave Marias, marcadas pelas contas pequenas, precedidas por um Pai Nosso, marcado por uma conta maior, e concluída por um Glória ao Pai. Também no Breviário Romano, o grande livro universal de devoção, o qual todo padre deve ler em privado uma porção a cada dia, sob pena de pecado mortal se não o fizer, usa a seguinte forte linguagem no que diz respeito à virgem: "Se o vento das tentações se levanta, se o escolho das tribulações se interpõe em teu caminho, olha a estrela, invoca Maria. Se és balouçado pelas vagas do orgulho, da ambição, da maledicência, da inveja, olha a estrela, invoca Maria. Se a cólera, a avareza, os desejos impuros sacodem a frágil embarcação de tua alma, levanta os olhos para Maria. Se, perturbado pela lembrança da enormidade de teus crimes, confuso à vista das torpezas de tua consciência, aterrorizado pelo medo do juízo, começas a te deixar arrastar pelo turbilhão da tristeza, a despencar no abismo do desespero, pensa em Maria. Nos perigos, nas angústias, nas dúvidas, pensa em Maria, invoca Maria". Assim a adoração a Maria tornou-se, completamente, a adoração da Cristandade, e toda catedral, e quase todas as igrejas espaçosas, tinha sua "Capela de Nossa Senhora".

É certamente mais que evidente, a partir dessas citações, que Maria é invocada não apenas como uma intercessora com seu Filho, mas como o primeiro e mais elevado objeto de adoração. E essas citações são exemplos calmos e sóbrios comparados à linguagem bravia de uma adoração ardente, que pode ser encontrada em hinos, saltérios e breviários. Os atributos de Deus são atribuídos a ela, que é representada como a Rainha do Céu, sentada entre querubins e serafins. O dogma da Imaculada Conceição (ou "Imaculada Concepção") foi o resultado natural dessa crescente adoração a Maria, e tem sido reafirmado como um artigo de fé na igreja católica pelos papas atuais, e aceito pelos fiéis em geral.

domingo, 18 de junho de 2017

Extremos de Caráter

Exatamente neste ponto de nossa história encontramos, através da sutileza de Satanás, os caracteres mais extremos e opostos. O único objetivo de Hildebrando era subjugar o mundo exterior; as autoinfligidas crueldades dos outros deveriam subjugar o mundo dentro de si mesmos.

Pedro Damiano, bispo de Óstia, era severamente ascético [voltado ao monasticismo]. Ele se reclusava em roupas de saco, fazia jejuns, vigiava, orava e, tentando domar suas paixões, podia se levantar à noite, ficar por horas debaixo de uma corrente de água até que seus membros ficassem rígidos de frio, e depois passava o resto da noite visitando igrejas e recitando o Saltério*. O objetivo declarado pelo qual ele tanto trabalhava era a restauração da dignidade do sacerdócio e uma disciplina da igreja mais rigorosa. Tal é o poder delusório do inimigo dentro da igreja de Roma. 

{*Saltério: Livro dos Salmos}

Mas um monge, chamado Domínico, foi considerado o grande herói dessa guerra contra o pobre e inofensivo corpo. Satanás escondeu dessa dupla a diferença entre o corpo e as obras do corpo. Domínico usava, próximo à pele, uma apertada couraça de ferro, a qual ele nunca tirava. Seu pescoço era carregado de pesadas correntes, suas poucas roupas eram desgastadas como trapos, sua comida era das mais grosseiras, sua pele era tão escura como a de um negro pelos efeitos de sua disciplina. Seu exercício usual era recitar o Saltério duas vezes por dia, enquanto se flagelava com as duas mãos a uma frequência de mil chicotadas a cada dez salmos. Era reconhecido que 3000 chicotadas eram equivalentes a um ano de penitência; o Saltério inteiro, portanto, com esse acompanhamento, era equivalente a cinco anos. Na Quaresma, ou em ocasiões de penitência especial, a média diária subia para três saltérios; ele "facilmente" (?) passava por vinte -- equivalente a cem anos de penitência -- em seis dias. Certa vez, no início da Quaresma, ele implorou para que uma penitência de mil anos fosse-lhe imposta, e cumpriu toda ela antes da Páscoa.   

Supunha-se que essas flagelações tivessem o efeito de uma satisfação pelos pecados de outras pessoas -- obras de supererrogação*, que formavam o capital para a venda de indulgências, das quais ouviremos mais no decorrer da história. A morte misericordiosamente pôs um fim aos seus lamentáveis delírios no ano 1062.

{*Supererrogação: Demasia, excesso.}

Tomemos mais um exemplo da vida eclesiástica, uma vez que Satanás encontrou algo adequado a todos os gostos.

Os clérigos mundanos tinham o hábito de comparecer junto às tropas de soldados, com espadas e lanças. Eles se cercavam de homens armados como um general pagão. Todos os dias desfrutavam de banquetes reais e desfiles diários; a mesa cheia de iguarias; os convidados, seus voluptuosos favoritos. Crime e licenciosidade eram comuns nos palácios do clero. Tão grande era a iniquidade de Roma no século X que os historiadores, em consenso geral, colocam um véu sobre isso pelo bem de nossa humanidade comum. Será que as pessoas que corriam para Roma sabiam que, durante um período de um século e meio, por volta dessa época, eram tão terríveis as cenas do Vaticano, a ponto de "dois papas terem sido assassinados, cinco foram exilados, quatro foram depostos, e três renunciaram a sua perigosa dignidade. Alguns foram levados à cadeira pontifical pelas armas, alguns por dinheiro, e alguns receberam a tiara das mãos de cortesãs principescas... Seria herege dizer que as portas do inferno tinham prevalecido contra o trono e o centro do catolicismo; mas o próprio Barônio pode ser citado para provar que eles tinham recuado de suas articulações infernais para enviar espíritos malignos, comissionados para esvaziar sobre sua cabeça devota os frascos de amargura e ira."*

{* Sir James Stephens, Biografia Eclesiástica, vol. 1, p. 2; Milman, vol. 3, p. 103; Robertson., vol. 2, p. 515.}

Passamos agora ao objeto imediato de nossa história -- a carreira de Hildebrando como Gregório VII, de cujos lábios ouviremos um relato de papas infalíveis muito diferentes dos citados acima.

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