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domingo, 17 de julho de 2016

Reflexões sobre a Primeira Grande Cisma na Igreja

Como esta foi a primeira cisma que dividiu a igreja, pensamos ser interessante nos ocuparmos com alguns detalhes. O leitor pode aprender algumas lições necessárias a partir dessa divisão memorável. Ela começou com um incidente tão insignificante em si que mal mereceria um lugar na história. Não havia qualquer questão de má doutrina ou de imoralidade, mas apenas uma eleição disputada para a Sé de Cartago. Um pouco de correção, um pouco de abnegação, um verdadeiro desejo pela paz, unidade e harmonia da igreja, e acima de tudo um cuidado adequado pela glória do Senhor, teriam prevenido centenas de anos de tristeza por dentro e desgraça por fora para a igreja de Deus. Mas ao orgulho, à avareza e à ambição - tristes frutos da carne - foi permitido que realizassem seu terrível trabalho. O leitor também pode ver, pelo lugar que o imperador tinha nos concílios da igreja, quão cedo sua posição e caráter foram totalmente alterados. Quão estranho deve ter parecido para Constantino que, imediatamente após ter adotado a cruz como seu estandarte, um apelo fosse feito ao seu próprio tribunal por uma decisão episcopal sobre assuntos eclesiásticos! Isto provou a condição do clero. Mas devemos notar as consequências que tal apelo envolve: se a parte contra quem a sentença do poder civil foi dada se recusasse a acatá-la, eles se tornariam transgressores da lei. E foi exatamente isso o que aconteceu.

Os donatistas foram, portanto, tratados como ofensores das leis imperiais; eles foram privados de suas "igrejas" e muitos deles sofreram banimento e confiscação. Até mesmo a pena de morte foi decretada contra eles, embora não pareça que essa lei tenha sido aplicada em qualquer caso durante o reinado de Constantino. Medidas poderosas, no entanto, foram utilizadas pelo Estado visando compelir os donatistas a se reunirem com os católicos. Mas, como é comum em tais casos, e como a experiência tem sempre demonstrado, a força que era usada para compeli-los apenas serviu para desenvolver o espírito selvagem da facção que já existia em sua semente. Despertados pela perseguição, estimulados pelo discursos de seus bispos e especialmente por Donato, que era a cabeça e alma de seu partido, eles incorreram em toda espécie de fanatismo e violência.

Constantino, ensinado pela experiência, por fim descobriu que, embora ele pudesse dar proteção à igreja, ele não podia dar-lhe paz. E assim ele emitiu um decreto concedendo aos donatistas total liberdade de agir de acordo com suas próprias convicções, declarando que isto era um assunto que pertencia ao julgamento de Deus.*

{* Neander, vol. 3, p. 244; Robertson, vol. 1, p. 175; Milman, vol. 2, p. 364.}

sábado, 9 de julho de 2016

As Controvérsias do Donatismo e do Arianismo

Duas grandes controvérsias - o donatismo e o arianismo - tiveram seu início nesse reinado: o primeiro surgiu no Ocidente a partir de uma disputada nomeação à dignidade episcopal em Cartago; e o último, de origem oriental, envolvia os próprios fundamentos do cristianismo. O arianismo era uma questão de doutrina, e o donatismo de prática. Ambos estavam corrompidos em suas próprias fontes e essências, e podem ser representados pelo falso profeta e, especialmente, pelos nicolaítas. Vamos agora observar brevemente essas duas cismas, uma vez que lançam luz sobre a natureza e os resultados da união da igreja com o Estado. O imperador tomava parte nos conselhos dos bispos como "cabeça da igreja".

Na morte de Mensúrio, bispo de Cartago, um concílio de bispos das redondezas foi convocado para nomear seu sucessor. O concílio era pequeno -- pois a organização estava por conta de Botrus e Celésio, dois presbíteros que aspiravam ao cargo -- mas foi Ceciliano, um diácono que era muito amado pela congregação, que foi eleito bispo. Os dois desapontados presbíteros protestaram contra a eleição. Mensúrio morreu estando ausente de Cartago em uma viagem, mas antes de sair de casa ele tinha confiado alguns bens da igreja a alguns anciãos da congregação, e tinha deixado um inventário nas mãos de uma mulher piedosa. Este foi entregue a Ceciliano que, é claro, exigiu que os artigos dos anciãos fossem devolvidos, mas eles não estavam disposto a entregá-los, uma vez que supunham que ninguém jamais iria perguntar sobre eles após o velho bispo ter morrido. Assim eles se uniram ao partido de Botrus e Celésio, em oposição ao novo bispo. A cisma foi também apoiada pela influência de Lucila, uma senhora rica a quem Ceciliano tinha anteriormente ofendido por uma repreensão piedosa; e assim toda a província assumiu o direito de interferir no assunto.

Donato, bispo de Casa Nigra, colocou-se à frente da facção cartaginesa. Segundo, primaz de Numídia, por convocação de Donato, apareceu em Cartago liderando setenta bispos. Este auto-instituído concílio intimou Ceciliano a comparecer perante eles, alegando que ele não deveria ter sido consagrado exceto na presença deles e do primaz da Numídia; além disso, considerando que Ceciliano tinha sido um traditor*, não podia ser bispo, e assim o concílio declarou anulada sua eleição. Ceciliano se recusou a reconhecer a autoridade do concílio, mas eles prosseguiram em eleger Majorino para o cargo de bispo, que eles declararam vago pela excomunhão de Ceciliano. Infelizmente, para a reputação dos bispos, Majorino pertencia à família de Lucila que, para apoiar a eleição, doou grandes somas de dinheiro para garantir a eleição, que os bispos dividiram entre si. Uma cisma decidida estava agora formada, e muitas pessoas que estavam indiferentes a Ceciliano, depois disso, voltaram a ter comunhão com ele.

{* "Um nome de infâmia dado àqueles que, para salvarem suas vidas durante a perseguição, tinham entregue as Escrituras ou bens da igreja aos perseguidores." Milner, vol. 1, p. 513}

Alguns relatos dessas discórdias chegaram aos ouvidos de Constantino. Ele tinha acabado de se tornar o senhor do Ocidente, e tinha enviado uma grande soma de dinheiro para o alívio das igrejas africanas. Eles tinham sofrido muito durante as últimas perseguições. Mas, como os donatistas eram tidos como sectários, ou dissidentes da verdadeira igreja católica, ele ordenou que os presentes e privilégios conferidos aos cristãos pelos último decretos fossem limitados àqueles em comunhão com Ceciliano. Isto levou os donatistas a uma petição ao imperador, desejando que sua causa pudesse ser examinada pelos bispos da Gália, de quem supunham que a imparcialidade poderia ser esperada. Aqui, pela primeira vez, temos uma aplicação do poder civil para nomear uma Comissão de Juízes Eclesiásticos.

Constantino concordou: um concílio foi realizado e Roma, em 313, que consistiu de cerca de vinte bispos. A decisão foi a favor de Ceciliano, que logo a seguir propôs termos de reconciliação e reunião; mas os donatistas desprezaram qualquer compromisso. Eles suplicaram ao imperador por outra audiência declarando que um sínodo de vinte bispos era insuficiente para anular a sentença de setenta que tinham condenado Ceciliano. Por esta representação Constantino convocou outro concílio. O número de bispos presentes era muito grande, vindos da África, Itália, Sicília, Sardenha, e especialmente da Gália. Esta foi a maior assembleia eclesiástica que houve até então. Eles se reuniram em Arles, no ano de 314. Ceciliano foi novamente absolvido, e vários decretos canônicos foram estabelecidos com vista ao término das dissensões africanas.

Nesse meio-tempo Majorino morreu, e um segundo Donato foi apontado como seu sucessor. Ele foi apelidado pelos seus seguidores como "o Grande", a fim de distingui-lo do primeiro Donato. Ele é descrito como alguém erudito, eloquente, de grande capacidade, e que possuía a energia e o zelo ardente do temperamento africano. Os sectários, como eram chamados, assumiram então a alcunha de os donatistas, tomando o caráter, assim como o nome, de seu chefe.

domingo, 8 de maio de 2016

O Martírio de Cipriano sob o Reinado de Valeriano

Como o nome de Cipriano deve ser familiar para todos os nossos leitores e um nome muito famoso relacionado ao governo e disciplina na igreja, pode ser interessante observar particularmente a coragem serena deste "pai" apostólico na perspectiva do martírio.

Ele nasceu em Cartago por volta do ano 200, mas não foi convertido até por volta do ano 246. Embora em idade madura, ele possuía o vigor e ardor da juventude. Ele tinha sido um distinto mestre e retórico, e agora ele era um distinto cristão devoto e fervoroso. Ele foi logo promovido aos ofícios de diácono e presbítero, e em 248 foi eleito bispo pela vontade geral do povo. Seus trabalhos foram interrompidos pela perseguição sob Décio, mas sua vida foi preservada até o ano de 258. Na manhã do dia 13 de setembro, um oficial com soldados foi enviado pelo procônsul para que o trouxessem a sua presença. Cipriano então sabia que seu fim estava próximo. Com uma mente pronta e um semblante alegre ele foi sem demora. Seu julgamento foi adiado por um dia. A notícia de sua apreensão agitou toda a cidade. Seus conhecidos ficaram a noite toda em frente ao lugar onde se encontrava preso.

De manhã ele foi levado ao palácio do procônsul cercado por uma grande multidão de pessoas e uma forte guarda de soldados. Após um pequeno atraso, o procônsul apareceu. "És tu Tácio Cipriano, o bispo de tantos homens ímpios?", disse o procônsul. "Eu sou", respondeu Cipriano. "O sacratíssimo imperador te ordena que sacrifiques." "Eu não sacrifico", ele respondeu. "Consideres bem", replicou o procônsul. "Execute as tuas ordens", respondeu Cipriano, "o caso não admite qualquer reconsideração."

O governador consultou seu conselho, e então proferiu a sentença: "Tácio Cipriano, tens vivido por muito tempo em tua impiedade, e reuniste ao redor de ti muitos homens envolvidos na mesma conspiração perversa. Tu tens mostrado a ti mesmo como um inimigo dos deuses e das leis do império; os piedosos e sagrados imperadores têm em vão se esforçado para lembrar-te do culto de teus ancestrais. Desde então tens sido o principal autor e líder dessas práticas culpadas, que sejas então um exemplo para aqueles que tiveste iludido em tuas assembleias ilegais. Tu deves expiar teu crime com teu sangue." "Deus seja louvado!", respondeu Cipriano, e a multidão de irmãos exclamou: "Que sejamos também martirizados com ele.". O bispo foi levado até um campo vizinho e decapitado. Foi marcante o fato de que alguns dias depois o procônsul morreu. E o imperador Valeriano, no ano seguinte, foi derrotado e levado como prisioneiro pelos persas, que o trataram com grande e desdenhosa crueldade - uma calamidade e desgraça sem precedentes nos anais de Roma.

A morte miserável de muitos dos perseguidores causou grande impressão na mente pública, e forçou em muitos a convicção de que os inimigos do cristianismo eram os inimigos do céu. Por cerca de quarenta anos após este ultraje, a paz e prosperidade da igreja não foi seriamente interrompida, de modo que podemos deixar de lado esses anos para chegarmos à disputa final entre paganismo e cristianismo.

domingo, 10 de abril de 2016

Perpétua e Seus Companheiros

Dentre outros que foram presos e martirizados na África durante essa perseguição, Perpétua e seus companheiros, dentre todas as histórias, merecem um lugar distinto. A história do martírio deles não só carrega todo o selo dessa verdade circunstancial, como também está repleta de toques mais requintados de sentimento e afeição natural. Aqui vemos a bela combinação dos mais ternos sentimentos e dos mais fortes afetos que o cristianismo reconhece em todos os seus direitos, e os torna ainda mais profundos e ternos porque foi a causa do sacrifício deles sobre o altar da total dedicação àquEle que morreu em total dedicação a nós. "O qual me amou", como diz a fé, com propriedade, "e se entregou a si mesmo por mim." (Gálatas 2:20)

Em Cartago, no ano 202, três jovens homens, Revocato, Saturnino e Secundulo, e duas moças, Perpétua e Felicidade, foram presos, todos eles sendo ainda catecúmenos, isto é, novos convertidos que se preparavam para o batismo e comunhão. Perpétua era de boa família, rica e nobre, de educação liberal, e honrosamente casada. Ela tinha cerca de 22 anos de idade, e era mãe de um bebê ainda de peito. Toda sua família aparentemente era cristã, com exceção de seu pai, que ainda era pagão. Nada é dito sobre seu marido. Seu pai era muito apegado a ela, e temia muito a desgraça que seus sofrimentos por Cristo trariam para sua família. Assim ela tinha de lutar não apenas com a morte em sua forma mais terrível, mas também com todo laço sagrado da natureza.

Quando ela foi levada pela primeira vez perante seus perseguidores, seu velho pai veio e pediu que ela se retratasse e dissesse que não era cristã. "Pai", ela respondeu calmamente, apontando para um vaso que estava no chão, "poderia eu chamar esse vaso de qualquer coisa além do que ele é?" "Não", ele respondeu. "Assim também eu não poderia te dizer nada além do que eu sou, uma cristã." Alguns dias depois, os jovens cristãos foram batizados. Apesar de estarem sob guarda, eles não estavam ainda presos na prisão. Mas pouco tempo depois disto, eles foram lançados na masmorra. "Então", ela disse, "eu fui tentada, estava apavorada, pois eu nunca tinha estado em tal escuridão antes. Oh, que dia terrível! O calor excessivo ocasionado pelo número de pessoas, o duro tratamento dos soldados, e, finalmente, a ansiedade por causa do meu bebê, me tornou miserável." Os diáconos, no entanto, conseguiram adquirir para os prisioneiros cristãos um lugar melhor, onde ficavam separados dos criminosos comuns. Tais vantagens podiam geralmente ser adquiridas dos corruptos supervisores das prisões. Perpétua estava agora feliz por ter seu filho consigo. Ela o pegou no colo e exclamou: "Agora, esta prisão se tornou um palácio para mim!".

Após alguns dias houve um rumor de que os prisioneiros seriam examinados. O pai apressou-se até sua filha em grande aflição de espírito. "Minha filha", disse ele, "tenha pena de meus cabelos grisalhos, tenha pena do seu pai, se ainda sou digno de ser chamado seu pai. Se eu a eduquei até a flor da sua juventude, se eu preferi você a todos os seus irmãos, não me exponha a tal vergonha entre os homens. Olhe para o seu bebê - seu filho que, se você morrer, não poderá sobreviver por muito tempo. Deixe seu espírito elevado de lado, para que todos nós não mergulhemos em ruínas. Pois se você morrer, então nenhum de nós jamais terá coragem de falar livremente de novo." Enquanto ele falava isto, ele beijou suas mãos, se lançou a seus pés, suplicando-lhe com termos carinhosos e muitas lágrimas. Mas, embora muito comovida e aflita pela visão do seu pai e sua forte e terna afeição por ela, ela ficou calma e firme, e sentiu-se principalmente preocupada pelo bem de sua alma. "Os cabelos grisalhos de meu pai", disse ela, "me afligem ao considerar que apenas ele da minha família não se regozijaria com meu martírio." "O que acontecerá", disse-lhe ela, "quando eu chegar perante o tribunal, depende da vontade de Deus, pois não permanecemos em pé por nossa própria força, mas apenas pelo poder de Deus."

Ao chegar a hora decisiva - o último dia do julgamento deles - uma imensa multidão se reuniu. O velho pai novamente apareceu, na esperança de poder, pela última vez, mudar a ideia de sua filha. Nesta ocasião ele levou seu neto recém-nascido em seus braços, e pôs-se diante dela. Que momento! Que espetáculo! Seu velho pai, seus cabelos grisalhos, seu tenro bebê: que apelo para uma filha - para o coração de uma jovem mulher! "Tenha pena dos cabelos grisalhos de seu pai", disse o governador, "tenha pena de sua criança indefesa, e ofereça sacrifício em prol da prosperidade do imperador." Assim ela se apresentou perante o tribunal, perante a multidão reunida, perante as admiradas miríades dos céus, perante as tenebrosas hostes do inferno. Mas Perpétua estava calma e firme. À semelhança de Abraão, pai dos que creem, seus olhos não estavam agora em seu filho, mas no Deus da ressurreição. Tendo encomendado seu filho aos cuidados de sua mãe e de seu irmão, ela respondeu ao governador, e disse: "Isto não posso fazer." "Você é cristã?", ele perguntou. "Sim", ela respondeu, "sou cristã". Seu destino estava agora decidido. Eles foram todos condenados a servirem de cruel entretenimento para o povo e os soldados, em uma luta com feras selvagens, na festa de aniversário do jovem Geta, filho mais novo do imperador. Eles retornaram a suas masmorras, regozijando por terem sido capazes de testemunharem e sofrerem por amor a Cristo. O carcereiro, Pudas, foi convertido por meio do comportamento tranquilo dos prisioneiros.

Quando foram levados ao anfiteatro, os espectadores notaram que os mártires tinham uma aparência pacífica e alegre. De acordo com um costume que prevalecia em Cartago, os homens deviam ser vestidos de escarlate como os sacerdotes de Saturno, e as mulheres de amarelo como as sacerdotisas de Ceres, mas os prisioneiros protestaram contra tal procedimento. "Viemos aqui", disseram, "por nossa própria escolha, e não deixaremos que nossa liberdade seja tirada de nós; nós desistimos de nossas vida para não sermos forçados a tais abominações." Os pagãos reconheceram que o pedido deles era justo, e cederam. Após se despedirem entre si com o mútuo beijo do amor cristão, com a esperança certa de logo se encontrarem novamente, estando "fora do corpo, para habitar com o Senhor" (2 Co 5:8), eles foram adiante para a cena de morte em seus trajes simples. A voz de louvor a Deus foi ouvida pelos espectadores. Perpétua estava cantando um salmo. Os homens foram expostos a leões, ursos e leopardos; as mulheres foram atiradas a uma vaca furiosa. Mas todos foram rapidamente libertados de seus sofrimentos pela espada do gladiador, e entraram na alegria do seu Senhor.

A interessante narrativa aqui resumida, e que supõe-se ter sido escrita pelas próprias mãos de Perpétua {* N. do T.: obviamente até o momento anterior ao seu martírio}, respira tal ar de verdade e realismo que conquistou o respeito e confiança de todas as eras. Mas o nosso principal objetivo ao escrevê-la para nossos leitores é apresentá-los a uma imagem viva na qual muitas das melhores qualidades da fé cristã estão belamente mescladas com os mais calorosos e ternos sentimentos cristãos, e para que possamos aprender a não sermos reclamões e murmuradores, mas a suportar todas as coisas por amor de Cristo, para que Sua graça possa brilhar, nossa fé triunfar, e Deus ser glorificado.

Alguns anos após esses eventos, Severo voltou sua atenção para a Grã-Bretanha, onde os romanos estiveram perdendo terreno. O imperador, estando à frente de um exército muito poderoso, rechaçou os nativos independentes da Caledônia, e reconquistou a região ao sul da muralha de Antonino, mas perdeu tantas tropas nas sucessivas batalhas em que foi obrigado a lutar que não achou apropriado forçar suas conquistas além daquele limite. Sentindo o tempo de seu fim se aproximando, ele se retirou para York, onde logo expirou, no décimo oitavo ano de seu reinado, em 211 d.C.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

O Rápido Progresso do Cristianismo

Sem dúvidas, as causas e meios foram divinos. Eles provam ser assim. O Espírito de Deus, que desceu em poder no dia de Pentecostes, e que tinha tomado Sua morada na igreja e em cada cristão individualmente, é a verdadeira fonte de todo o sucesso na pregação do evangelho, na conversão das almas, e no testemunho para Cristo contra o mal. "Não por força nem por violência, mas sim pelo meu Espírito, diz o Senhor" (Zacarias 4:6). Além disso, o Senhor prometeu estar com Seu povo o tempo todo: "E eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos." (Mateus 28:20). Mas nosso objetivo aqui é olhar para as coisas historicamente, e não apenas com a segurança da fé:

1. Uma das grandes causas da rápida propagação do cristianismo é sua perfeita adaptação ao homem em qualquer idade, em qualquer país, e em qualquer condição. Ele aborda todos como perdidos, e supõe uma falta em todos. Assim, ele se adapta ao judeu e ao gentio, ao rei e ao súdito, aos sacerdotes e ao povo, ao rico e ao pobre, ao jovem e ao velho, ao erudito e ao ignorante, ao moral e ao devasso. É a religião de Deus para o coração, e ali firma Sua soberania, e a Sua apenas. Ele se anuncia como o "poder de Deus para salvação de todo aquele que crê" (Romanos 1:16). Ele propõe levantar o homem das profundezas mais profundas de degradação para as alturas mais elevadas da glória eterna. Quem é capaz de estimar, apesar de todo preconceito, o efeito da proclamação de tal evangelho a pagãos miseráveis e ignorantes? Milhares, milhões, cansados de uma religião sem valor e desgastada, responderam à voz celestial, foram reunidos em torno do nome de Jesus, tomaram com alegria o espólio de seus bens, e estavam prontos para sofrer por amor a Ele. O amor reinava na nova religião, e o ódio na antiga.

2. A confirmação e manutenção de todas as relações terrenas que estivessem de acordo com Deus é outro motivo para a aceitação do evangelho entre os pagãos. Cada um era exortado a permanecer em seus relacionamentos e a procurar glorificar a Deus neles. As bênçãos do cristianismo para as esposas, filhos e servos são indescritíveis. Seu amor, felicidade e conforto eram um espanto para os pagãos, e uma novidade entre eles. Ainda assim, tudo era natural e ordenado. Um cristão, que dizem ter vivido nessa época - no início do segundo século - descreve assim seus contemporâneos: "Os cristãos não são separados dos outros homens pelo lugar onde moram, por língua ou por costumes. Eles não moram em um lugar especial na cidade, eles não usam uma linguagem diferente ou assumem um estilo de vida extravagante. Eles habitam nas cidades dos gregos, e dos bárbaros... e embora se adaptem aos costumes da região, no que diz respeito ao modo de vestir, à comida, e outras coisas que pertencem à vida exterior, eles ainda assim mostram uma conduta peculiar que é maravilhosa e marcante para todos. Eles obedecem as leis existentes, e superam a lei pela forma com que vivem." *

{* História da Igreja, de Neander, vol. 1, p. 95.}

3. As vidas irrepreensíveis dos cristãos, a pureza divina de suas doutrinas, sua paciência, alegre resistência a sofrimentos piores que a morte, assim como a própria morte, seu desprezo por qualquer objeto de ambição comum, sua ousadia na fé a ponto de correrem risco de vida, crédito e propriedades; estes eram os principais recursos na rápida disseminação do cristianismo. "Pois quem", diz Tertuliano, "ao observar tais coisas, não é impelido a investigar a causa? E quem, tendo investigado, não abraça o cristianismo, e tendo abraçado, não tem o desejo de sofrer por isso?"

Essas poucas indicações permitirão ao leitor formar um juízo mais definitivo quanto ao que, por um lado, tendia a impedir, e o que, por outro lado, tendia a promover o progresso do evangelho de Cristo. Nada pode ser mais interessante para a mente cristã que o estudo dessa grande e gloriosa obra. Os obreiros do Senhor, em sua maioria, eram homens simples e iletrados; eram pobres, sem amigos e destituídos de toda a ajuda humana; e ainda assim, em pouco tempo, persuadiram uma grande parte da humanidade a abandonar a religião de seus ancestrais, e a abraçar uma nova religião que é oposta às disposições naturais dos homens, aos prazeres do mundo, e aos estabelecidos costumes das eras. Quem poderia questionar o poder que vinha de dentro do cristianismo tendo tais fatos exteriores diante de si? Certamente foi o Espírito de Deus que revestiu de poder as palavras daqueles primeiros pregadores! Certamente a força deles nas mentes dos homens era divina. Uma mudança completa foi produzida: foram nascidos de novo - criados de novo em Cristo Jesus.

Em menos de cem anos a partir do dia de Pentecostes, o evangelho tinha penetrado na maioria das províncias do império romano, e foi largamente difundido em muitos delas. Em nosso breve resumo da vida de Paulo, e na tabela cronológica de suas missões, traçamos o primeiro plantio de muitas igrejas, e a propagação da verdade em muitas regiões. Nas grandes cidades centrais, tais como a Antioquia na Síria, Éfeso na Ásia, e Corinto na Grécia, vimos o cristianismo bem estabelecido, e espalhando suas ricas bênçãos entre as cidades e vilas vizinhas.

Também aprendemos, da antiguidade eclesiástica, que Cartago era para a África o mesmo que essas cidades eram para a Síria, Ásia e Grécia. Quando Escápula, o presidente de Cartago, ameaçou os cristãos com tratamento severo e cruel, Tertuliano, em um de seus veementes apelos, tentou fazê-lo refletir: "O que pretendes fazer", diz ele, "com tantos milhares de homens e mulheres de todas as idades e dignidades, por mais que livremente se ofereçam a si mesmos? Quantas fogueiras e espadas ainda serão necessárias? O que Cartago é capaz de sofrer se for dizimada por ti? Quando todos encontrarem ali o seu parente mais próximo e vizinhos, verá matronas e possivelmente homens de sua própria classe social e condição, e as pessoas mais importantes, também parentes ou amigos daqueles que são teus amigos mais próximos. Poupe-os então, por isso, para o seu próprio bem, se não para o nosso." *

{* Cristianismo Primitivo, de Cave, p. 20.}

Vamos agora continuar a narrativa dos eventos, e o próximo na ordem a ser relacionado é o martírio de Inácio.

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