sábado, 23 de agosto de 2014

A Conversão de Saulo de Tarso

Nenhum evento no progresso da história da igreja a afeta tão profundamente, ou tão felizmente, quanto a conversão de Saulo de Tarso. De principal dos pecadores ele se tornou o principal dos santos - do mais violento opositor de Cristo ele se tornou o mais zeloso defensor da fé - como inimigo e perseguidor do nome de Jesus na Terra, ele era o "principal"; todos os outros, em comparação a ele, eram subordinados (Atos 9; 1 Timóteo 1).

É bastante evidente, a partir do que ele fala sobre si mesmo, que ele acreditava que o judaísmo era não só divino, mas a perpétua e imutável religião de Deus para o homem. Seria difícil explicar a força de seus preconceitos judaicos sobre qualquer outro princípio. Portanto, todas as tentativas de pôr de lado a religião dos judeus, e de introduzir outra, ele considerava como sendo algo do inimigo, devendo ser arduamente combatidas. Ele tinha ouvido o nobre discurso de Estêvão - ele tinha testemunhado sua morte triunfante - mas sua subsequente perseguição aos cristãos mostrou que a glória moral daquela cena não o havia impressionado de maneira séria em sua mente. Ele foi cegado pelo zelo; mas o zelo pelo judaísmo agora era um zelo contra o Senhor. Neste exato momento ele estava "respirando ainda ameaças e mortes contra os discípulos do Senhor" (Atos 9:1).

Ouvindo que alguns dos santos perseguidos haviam encontrado um abrigo em Damasco, uma antiga cidade da Síria, ele se convenceu a ir até lá e trazê-los de volta a Jerusalém como criminosos. Para este fim, ele recebeu cartas do sumo sacerdote e do conselho de anciãos, de que ele poderia trazê-los presos a Jerusalém para serem punidos (Atos 22, 26). Ele, então, se torna o próprio apóstolo da malícia judaica contra os discípulos de Jesus - ignorantemente, sem dúvida, mas ele se fez o missionário voluntário deles.

Com sua mente forjada até o tom mais violento do zelo perseguidor, ele segue em sua memorável jornada. Inabalável em seu apego fervoroso pela religião de Moisés, e determinado a punir os convertidos ao cristianismo como apóstatas da fé de seus ancestrais, ele se aproxima de Damasco. Mas lá, na plena energia de sua louca carreira, o Senhor Jesus o detém. Uma luz dos céus, mais forte que a luz do sol, brilha em torno dele, e o subjuga com seu brilho ofuscante. Ele cai por terra - com a vontade quebrada, a mente subjugada, o espírito humilhado, e completamente mudado. Seu coração é agora sujeito à voz que fala com ele. Raciocínio, extenuação e auto-justificação não têm lugar na presença do Senhor.

Uma voz da magnífica glória disse-lhe: "Saulo, Saulo, por que me persegues? E ele disse: Quem és, Senhor? E disse o Senhor: Eu sou Jesus, a quem tu persegues." (Atos 9:4-5). Então o Senhor Jesus, mesmo estando no Céu, declara que Ele próprio é ainda identificado com Seus discípulos na Terra. A unidade da igreja com Cristo, sua Cabeça nos céus, a semente da bendita verdade do "um só corpo", é resumida nessas poucas palavras: "Saulo, Saulo, por que me persegues? ... Eu sou Jesus, a quem tu persegues." Estar em guerra contra os santos é o mesmo que estar em guerra contra o próprio Senhor. Que bendita verdade para o crente, mas quão solene para o perseguidor!

A visão que Saulo tinha visto e a terrível descoberta que ele tinha feito o absorveram completamente. Ele fica cego por três dias, e não pode comer nem beber. Então ele entra em Damasco, cego, quebrantado e humilhado pelo solene juízo do Senhor! Quão diferente daquilo que ele pretendia! Ele agora se une à companhia daqueles que ele tinha resolvido exterminar. No entanto, ele entra pela porta, e humildemente toma seu lugar entre os discípulos do Senhor. Ananias, um discípulo fiel, é enviado para confortá-lo. Ele recebe sua vista de volta, é cheio do Espírito Santo, é batizado, e então é alimentado e fortalecido.

Alguns pensam que o Senhor dá, na conversão de Paulo, não somente uma amostra de Sua longanimidade, como em todo o pecador que é salvo, mas também um sinal da futura restauração de Israel. Paulo nos conta, ele próprio, ter obtido misericórdia porque ele fez tudo aquilo em ignorante incredulidade - e tal será a mesma situação de Israel nos últimos dias quando receber misericórdia. Como nosso próprio Senhor orou por eles: "Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem" (Lucas 23:34). Pedro também diz: "E agora, irmãos, eu sei que o fizestes por ignorância, como também os vossos príncipes" (Atos 3:17)

Mas, como o apostolado de Paulo difere, em muitos aspectos, do apostolado dos doze, será necessário observá-lo mais um pouco. A menos que essa diferença seja compreendida, o verdadeiro caráter da presente dispensação poderá não ser apreendida de maneira tão consistente.

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

O Eunuco Etíope Recebe o Evangelho

Filipe é agora chamado a deixar sua feliz e interessante obra em Samaria e descer até Gaza - um deserto - e lá pregar o evangelho a uma única pessoa. Certamente há, nesse fato, uma lição da mais profunda importância para o evangelista, e uma que não podemos deixar passar sem alguma breve observação.

O pregador, em tal cenário de despertar e conversão como houve em Samaria, necessariamente torna-se muito interessado na obra. Deus está colocando seu selo sobre o ministério da Palavra, e sancionando as reuniões em Sua presença. O obra do Senhor prospera. O evangelista é cercado de respeito e afeição, e seus filhos na fé naturalmente procuram por ele para obter mais luz e instrução para seus caminhos. "Como poderia ele deixar tal campo de trabalho?", muitos perguntariam, "Seria correto partir?". Apenas, respondemos, se o Senhor chamasse Seu servo a fazer isso, como Ele fez no caso de Filipe. Mas como alguém pode saber hoje em dia, visto que anjos e o Espírito não nos falam como falavam com Filipe? Embora um cristão, hoje em dia, não seja chamado dessa forma, ele deve procurar e esperar pela orientação divina. A fé deve ser seu guia. As circunstâncias não são seguras como guias; elas podem até nos repreender e nos corrigir em nosso andar, mas é o olho de Deus que deve ser nosso guia. "Guiar-te-ei com os meus olhos", essa é a promessa, "instruir-te-ei, e ensinar-te-ei o caminho que deves seguir" (Salmos 32:8).

Somente o Senhor sabe o que é melhor para Seus servos e para Sua obra. O evangelista, em tal cenário, correria o risco de sentir sua própria importância pessoal. Daí o valor, se não a necessidade, da mudança do lugar de serviço.

"Levanta-te", falou o anjo do Senhor a Filipe, "e vai para o lado do sul, ao caminho que desce de Jerusalém para Gaza, que está deserta. E levantou-se, e foi; e eis que um homem etíope, eunuco, mordomo-mor de Candace, rainha dos etíopes, o qual era superintendente de todos os seus tesouros, e tinha ido a Jerusalém para adoração, regressava e, assentado no seu carro, lia o profeta Isaías. E disse o Espírito a Filipe: Chega-te, e ajunta-te a esse carro." (Atos 8:27-29)

É bela a obediência imediata e incondicional de Filipe nesse momento. Ele não faz nenhum questionamento sobre a diferença entre Samaria e Gaza - entre sair de um amplo campo de trabalho e partir para um lugar deserto para falar com uma única pessoa sobre a salvação. Mas o Espírito de Deus estava com Filipe. E o único desejo do evangelista deveria ser de sempre seguir a direção do Espírito. A partir da falta de discernimento espiritual, um pregador poderia permanecer no mesmo lugar após o Espírito ter terminado seu trabalho ali, e assim o serviço é vão.

Deus, em Sua providência, cuida de Seu servo. Ele envia um anjo para direcioná-lo quanto à estrada que ele havia de tomar. Mas quando se trata do evangelho e do lidar com almas, o Espírito toma a direção. "E disse o Espírito a Filipe: Chega-te, e ajunta-te a esse carro." Não sabemos de nada, em toda a história da igreja, mais interessante que essa cena no caminho para Gaza. O anjo e o Espírito de Deus acompanham o evangelista: o primeiro representando a providência de Deus em indicar exatamente a estrada a tomar, e o último representando o poder espiritual direcionando o lidar com as almas. Assim como era, assim é agora, embora tendemos a adotar mais o hábito de pensar na orientação do Espírito do que na direção de providência. Que possamos confiar em Deus para tudo! Ele nunca muda!

O evangelho agora encontra seu caminho, na pessoa do tesoureiro da rainha, para o centro da Abissínia. O eunuco crê, é batizado, e segue seu caminho cheio de alegria. O que ele procurava, em vão, em Jerusalém, tendo seguido uma longa jornada até lá, ele encontra no deserto. Um belo exemplo da graça do evangelho! A ovelha perdida é encontrada no deserto, e águas vivas brotam de lá. O eunuco é também um belo exemplo de uma alma ansiosa. Quando sozinho e ocioso, ele lê o profeta Isaías.  Ele reflete sobre a profecia do sofrimento sem resistência do Cordeiro de Deus. Mas o momento de luz e libertação era chegado. Filipe explica o profeta: o eunuco é ensinado por Deus - ele crê: imediatamente deseja o batismo e retorna para casa, cheio das novas alegrias da salvação. Será que ele ficaria calado sobre o que encontrou quando lá chegasse? Certamente não, um homem de tal caráter e influência teria muitas oportunidades de disseminar a verdade. Mas, como tanto as Escrituras quanto a história são omissas quanto aos resultados de sua missão, não nos aventuremos além.

SUSTRIS, Lambert. "The Baptism of the Ethiopian Eunuch by the Deacon Philip"

O Espírito é ainda visto em companhia de Filipe e o leva para longe. Ele se encontra, então, em Azoto, e evangeliza todas as cidades até Cesareia.

Mas uma nova era na história da igreja começa a despontar. Um novo obreiro entra em cena: o mais notável, em muitos aspectos, que já serviu ao Senhor e à Sua igreja.

domingo, 3 de agosto de 2014

Jerusalém e Samaria Unidas pelo Evangelho

O amargo ciúme que existia entre judeus e samaritanos tinha sido, por muito tempo, proverbial; tanto que lemos: "os judeus não se comunicam com os samaritanos". Mas agora, em conexão com o Evangelho da paz, essa raiz de amargura desaparece. No entanto, na sabedoria dos caminhos de Deus, os samaritanos devem esperar pela mais elevada bênção do Evangelho até que os crentes judeus - os apóstolos da igreja em Jerusalém - impusessem suas mãos sobre eles, e oferecessem orações por eles. Nada pode ser mais profundamente interessante do que esse fato, quando tomamos em consideração a rivalidade religiosa que tinha sido, por tanto tempo, manifesta por ambos. Se Samaria não tivesse recebido essa lição oportuna de humildade, ela poderia ter sido descartada, mais uma vez, por manter sua orgulhosa independência de Jerusalém. Mas o Senhor não teria deixado assim. Os samaritanos tinham crido, se regozijado, e foram batizados, mas ainda não tinham recebido o Espírito Santo. "Os apóstolos, pois, que estavam em Jerusalém, ouvindo que Samaria recebera a palavra de Deus, enviaram para lá Pedro e João. Os quais, tendo descido, oraram por eles para que recebessem o Espírito Santo (porque sobre nenhum deles tinha ainda descido; mas somente eram batizados em nome do Senhor Jesus). Então lhes impuseram as mãos, e receberam o Espírito Santo." (Atos 8:14-17)

Identificação é a grande ideia da imposição de mãos, e unidade é a consequência do dom/dádiva do Espírito Santo. Esses são fatos importantes em conexão com o progresso da igreja. Samaria é, então, trazida à feliz associação com seu antigo rival, e feita uma só com a igreja em Jerusalém. Não há, na mente de Deus, pensamentos sobre uma assembleia ser independente da outra. Se elas tivessem sido abençoadas separada e independentemente, sua rivalidade poderia se tornar maior que nunca. Mas não deveria mais ser assim: "Nem neste monte nem em Jerusalém" (João 4:21), mas uma só Cabeça no Céu, um só corpo na Terra, um só Espírito, uma só família redimida adorando a Deus em espírito e em verdade, porque o Pai procura os que assim O adoram*.

{* Veja Lecture 6 de Atos 2, 8, 10, 19. Lectures on the New Testament Doctrine of the Holy Spirit, por W. Kelly. }

Para saber mais sobre a origem da mistura de povos e sobre a adoração de Samaria, leia 2 Reis 17. Eles eram apenas "metade" judeus, apesar de se gabarem por sua relação com Jacó. Eles consideravam os cinco livros de Moisés sagrados, mas subestimavam o restante da Bíblia. Eles eram circuncidados, guardavam a lei de maneira não muito fiel, e esperavam a vinda de um Messias. A visita pessoal do bendito Senhor a Samaria é do mais profundo e tocante interesse (João 4). Da fonte na qual Ele descansou diz-se que "ficava em um vale entre as duas famosas montanhas Ebal e Gerizim, onde foi lida a lei. Sobre este último estava o templo rival dos samaritanos, que por tanto tempo afligiu os judeus mais zelosos por sua ousada oposição ao único santuário escolhido, no Monte Moriá."

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