Séculos se passaram desde que vimos pela última vez o estado de coisas nessa ilha. São Patrício deixou para trás, quando morreu em 492, um grupo de homens bem educados e devotos, que veneravam muito seu mestre e procuravam seguir seus passos. A fama da Irlanda por seus mosteiros, escolas missionárias e como sede do ensino puro das Escrituras cresceu tanto que recebeu o honroso título de "Ilha dos Santos". No testemunho de Beda, aprendemos que, por volta da metade do século VII, muitos dos nobres e clérigos anglo-saxões se dirigiram à Irlanda, seja para receber instrução ou para ter a oportunidade de viver em mosteiros de disciplina mais rígida.
Já observamos o trabalho do clero irlandês como missionário*.
Os Culdees de Iona devem sua origem como comunidade cristã à pregação do
apóstolo irlandês Columba. A Grã-Bretanha, a França, a Alemanha, os países
baixos e diferentes partes do continente europeu ficaram em dívida
principalmente com os missionários irlandeses por seu primeiro contato com a
verdade divina. Carlos Magno, ele próprio um homem de letras, convidou para sua
corte vários estudiosos eminentes de diferentes países, mas especialmente da
Irlanda. Por muitas eras, ela manteve sua independência de Roma, rejeitou todo
controle estrangeiro e reconheceu a Cristo somente como Cabeça da igreja. Mas a
invasão dos dinamarqueses no início do século IX e a ocupação do país apagaram
a luz e mudaram o caráter da "ilha dos santos". Essas hordas
piráticas e predatórias devastaram seus campos, mataram seus filhos ou os
despojaram de sua herança, demoliram seus colégios e se mantiveram no país com
a crueldade e arrogância de usurpadores. Escuridão moral, espiritual e
literária se seguiram e prepararam o caminho para o romanismo. Até então, as
instituições religiosas e os trabalhos dos eclesiásticos constituíam os
principais temas de sua história; mas desde então, guerras internas,
turbulência, crime e desolação.
{* Veja Os Primeiros Pregadores do Cristianismo na Irlanda}
Várias tentativas foram feitas por pontífices romanos para sujeitar
a Igreja Irlandesa à Sé de Roma, mas sem sucesso até o reinado do Papa Adriano
IV. Ele era um inglês, conhecido pelo nome de Nicolas Breakspear; nascido na
pobreza e na obscuridade, tornou-se um monge de Santo Albano, e depois elevou-se
nos assuntos humanos até à dignidade pontifícia. Embora subitamente elevado da
indigência à opulência, seu orgulho e arrogância eram extremos. Ele ficou muito
ofendido com o imperador Frederico Barbarossa por não o apoiar e recusou-se a
dar-lhe o beijo da paz. Frederico declarou que sua omissão era fruto da
ignorância e, submetendo-se ao serviço como escudeiro de Sua Santidade, foi
perdoado e recebeu o beijo.
Entre os primeiros atos desse “modesto” pontífice, estava a presunção
de autoridade sobre a Irlanda e sua concessão a Henrique II, rei da Inglaterra.
O fundamento sobre o qual o papa baseou seu direito de fazer esta concessão foi
assim expresso: "Porque é inegável, e Vossa Majestade o reconhece, que
todas as ilhas nas quais brilhou Cristo, o sol da justiça, e que receberam a fé
cristã, pertencem de direito a São Pedro e à santíssima igreja romana." Em
virtude desse “direito”, ele autoriza Henrique a invadir a Irlanda com o
objetivo de ampliar a igreja, aumentar a religião e a virtude e erradicar o
joio do vício do jardim do Senhor; com a condição de que um centavo seja pago
anualmente de cada casa à Sé de Roma.
A partir desse período, em 1155, a igreja irlandesa passou a
ser essencialmente romanista em suas doutrinas, constituição e disciplina. Muito
antes da Reforma, "quase seiscentos estabelecimentos monásticos,
pertencentes a dezoito ordens diferentes, estavam espalhados por toda a face do
país. Frades fantasmagóricos, negros, brancos e cinzas, aglomeravam-se em
incontáveis multidões, praticando sua religião sobre um povo ignorante e
iludido". Em 1172, Henrique completou sua conquista do país; uma assembleia
do clero irlandês reunida em Waterford submeteu-se ao ditado papal, proclamou o
título de Henrique ao domínio soberano da Irlanda e fez o juramento de fidelidade
a ele e a seus sucessores. O rápido declínio agora marcava a igreja na
Irlanda. Sua famosa espiritualidade e inteligência se foram. Antes ela tinha
cerca de trezentos bispos; no alvorecer da Reforma, acreditamos que o número
era inferior a trinta. Os ciúmes, contendas e rebeliões mancharam quase todas
as páginas de sua história, tanto civil quanto eclesiástica, desde o século IX
até o presente.*
{* Ver History
of Ireland, de Froude; Faiths of the World, de Gardner, vol. 2, pág. 150; Variations
of Popery, de Edgar, p. 153 e 192.}
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