sábado, 23 de abril de 2016

Os Efeitos do Mundanismo na Igreja

O estudante da história da igreja se depara agora com o manifesto e terrível efeito do mundo na igreja. É uma visão muito triste, mas deveria ser uma lição proveitosa para o leitor cristão. O que era nesse período, continua agora, e deverá sempre ser. O Espírito Santo, que habita em nós, não é menos sensível hoje ao hálito poluído e destruidor do mundo do que era naquele tempo.

O que o inimigo não podia fazer por meio de éditos sangrentos e tiranos cruéis, ele conseguiu por meio da amizade com o mundo. Este é um velho estratagema de Satanás. A astuta serpente provou ser mais perigosa do que o leão que ruge. Por meio do favor de grandes homens, e especialmente de imperadores, ele fez com que o clero abaixasse a guarda, conduziu-os a dar as mãos com o mundo, e enganou-os por suas lisonjas. Os cristãos podiam agora erigir templos como os pagãos, e seus bispos eram recebidos na corte imperial em igualdade de condições com os sacerdotes idólatras. Este ímpio relacionamento com o mundo minou os próprios fundamentos do cristianismo deles. Isto se tornou dolorosamente manifesto quando a violenta tempestade da perseguição se sucedeu à  longa calma de sua prosperidade mundana.

Em muitas partes do império, os cristãos tinham desfrutado de paz sem distúrbio por um período de trinta anos, o que não foi bom para a igreja como um todo. Muitos não possuíam a fé vinda de uma ardente convicção, tal como ocorria no primeiro e segundo séculos, mas uma fé vinda da verdade incutida na mente pela educação cristã - o que prevalece hoje em escala alarmante. Uma perseguição irrompendo com grande violência, após tantos anos de tranquilidade, não podia deixar de relevar um processo de refinamento para as igrejas. A atmosfera do cristianismo tinha se corrompido. Cipriano, no Ocidente, e Orígenes, no Oriente, falam do espírito secular que tinha penetrado - do orgulho, luxo e cobiça do clero - nas vidas descuidadas e ímpias das pessoas.

"Se", diz Cipriano, bispo de Cartago, "a causa da doença é compreendida, a cura da parte afetada logo é encontrada. O Senhor provaria o Seu povo; e por causa do regime divinamente prescrito de vida ter sido perturbado na longa temporada de paz, um julgamento divino foi enviado para restabelecer nossa fé caída e, como poderia praticamente dizer, adormecida. Nossos pecados merecem coisa pior, mas nosso gracioso Senhor assim ordenou que tudo isso que ocorreu parece mais uma prova do que uma perseguição. Esquecendo-se do que os crentes faziam nos tempos dos apóstolos, e o que eles deveriam sempre continuar fazendo, os cristãos têm trabalhado com o desejo insaciável de aumentar suas posses terrenas. Muitos dos bispos que, por preceito e exemplo, deveriam ter guiado os outros, negligenciaram seu chamado divino para se envolver no gerenciamento de preocupações mundanas." Sendo esta a condição das coisas em muitas das igrejas, não é difícil imaginar o que aconteceu.

O imperador ordenou que uma rigorosa busca fosse feita por todos os suspeitos de se recusarem ao cumprimento para com o culto nacional. Os cristãos foram obrigados a se conformarem às cerimônias da religião pagã. Em caso de se negarem, ameaças, e depois torturas, eram empregadas para forçar a submissão. Se continuassem firmes, a punição de morte deveria ser infringida especialmente nos bispos, a quem Décio odiava mais amargamente. O costume era, onde quer que o terrível édito fosse seguido até a execução, a escolha de um dia no qual todos os cristãos do local deveriam se apresentar perante o magistrado, renunciar a sua religião, e oferecer incenso no altar do ídolo. Muitos, antes do terrível dia chegar, fugiam para o exílio voluntário. Os bens destes eram confiscados e eles mesmos eram proibidos de retornar, sob pena de morte. Aqueles que continuaram firmes, após repetidas torturas, foram lançados na prisão, quando foram empregados os sofrimentos adicionais da fome e da sede, tentando fazê-los mudar de ideia. Muitos que eram menos firmes e fiéis eram libertados sem sacrificar, comprando eles mesmo, ou permitindo que seus amigos comprassem, um certificado dos magistrados. Mas esta indigna prática foi condenada pela igreja como uma renúncia tácita.

Dionísio, bispo de Alexandria, ao descrever o efeito desse terrível decreto, diz "que muitos cidadãos de reputação consentiam com o édito. Alguns eram impelidos por seus medos, e alguns eram forçados por seus amigos. Muitos ficavam pálidos e trêmulos, que não estavam prontos nem a se submeterem à cerimônia idólatra, nem para resistirem até a morte. Outros suportavam suas torturas  até certo ponto, mas finalmente cediam." Tais foram alguns dos dolorosos e vergonhosos efeitos do relaxamento geral resultante do envolvimento com o presente século mau. É desconfortável para nós, que vivemos em um tempo de grande liberdade civil e religiosa, dizermos coisas duras sobre a fraqueza daqueles que viviam em tais tempos sanguinários. Em vez disso, devemos sentir a vergonha por nós mesmos, e orar para que possamos ser guardados de ceder às atrações do mundo em todas as suas formas. Mas nem tudo era defeito, graças ao Senhor. Vamos olhar por um momento para o lado bom das coisas.

sexta-feira, 22 de abril de 2016

A Perseguição Geral sob o Reinado de Décio

Décio, no ano 249, conquistou Filipe e colocou-se no trono. Seu reinado é marcante na história da igreja pela primeira perseguição geral. O novo imperador era desfavorável ao cristianismo e zelosamente devoto à religião pagã. Ele resolveu tentar o completo extermínio do primeiro, e restaurar o último à sua antiga glória. Uma das primeiras medidas de seu reinado foi emitir decretos aos governadores para que fizessem cumprir as antigas leis contra os cristãos. Eles foram ordenados, sob pena de perder suas próprias vidas, a exterminar todos os cristãos, completamente, ou trazê-los de volta por meio de sofrimentos e torturas à religião de seus pais.

Desde os tempos de Trajano havia uma ordem imperial de que os cristãos não deviam ser procurados; e havia também uma lei contra acusações privadas que fossem trazidas contra eles, especialmente se fossem por seus próprios servos - como vimos no caso de Apolônio - e essas leis tinham sido geralmente observadas pelos inimigos da igreja; mas agora elas eram totalmente negligenciadas. As autoridades procuravam os cristãos, os acusadores não corriam risco algum, e o clamor popular foi admitido no lugar da evidência formal. Durante os dois anos que se sucederam, uma grande multidão de cristãos em todas as províncias romanas foi banida, aprisionada ou torturada até a morte por vários tipos de punições e sofrimentos. Esta perseguição foi mais cruel e terrível que qualquer outra que a precedeu. Mas a parte mais dolorosa daquelas cenas de cortar o coração foi o estado debilitado dos próprios cristãos diante do triste efeito do conforto e prosperidade mundana.

sábado, 16 de abril de 2016

O Tratamento do Clero pelo Senhor

Mal as novas "igrejas" foram construídas, e os bispos recebidos na corte, e a mão do Senhor se voltou contra eles. Aconteceu dessa maneira:

Maximino, um rude camponês da Trácia, subiu ao trono imperial. Ele tinha sido o principal instigador da morte, se não o verdadeiro assassino, do virtuoso Alexandre. Ele começou seu reinado mandando prender e matar todos os amigos do último imperador. Aqueles que tinham sido seus amigos ele tornou seus próprios inimigos. Ele ordenou que os bispos, e particularmente aqueles que tinham sido amigos íntimos de Alexandre, fossem executados. Sua vingança caiu mais ou menos sobre todas as classes de cristãos, mas principalmente sobre o clero. Não era, no entanto, pelo cristianismo que eles sofreram nessa ocasião, uma vez que Maximino não se importava com qualquer religião, mas por causa da posição que eles tinham alcançado no mundo. Pode haver reflexão mais dolorosa do que esta?

Por volta dessa época destrutivos terremotos em várias províncias reacenderam o ódio popular contra os cristãos em geral. A fúria do povo sob tal imperador era irrestrita e, encorajados por governantes hostis, incendiaram as recém-construídas "igrejas" e perseguiram os cristãos. Mas, felizmente, o reinado desse selvagem imperador teve curta duração. Ele se tornou intolerável pelas pessoas. O exército se amotinou e o matou no terceiro ano de seu reinado, e uma época mais favorável para os cristãos retornou.

O reinado de Gordiano I, de 238 a 244 d.C., e o de Filipe, de 244 a 249, foram amigáveis para com a igreja. Mas repetidamente percebemos que um governo favorável aos cristãos era imediatamente seguido por outro que os oprimia. Foi particularmente o caso nessa época. Sob os sorrisos e o patrocínio de Filipe, o Árabe, a igreja desfrutou de grande prosperidade exterior, mas estava na véspera de uma perseguição mais terrível e mais generalizada do que qualquer outra que já tinha se passado.

Uma das causas que podem ter contribuído para isso foi a ausência dos cristãos nas cerimônias nacionais que comemoravam o milésimo ano de Roma, em 247 d.C. Os jogos seculares foram celebrados com grandiosidade sem precedentes por Filipe, mas como ele era favorável aos cristãos, eles escaparam da fúria dos sacerdotes pagãos e do populacho. Os cristãos eram agora um corpo reconhecido no Estado, e por mais cuidado que tivessem de evitar se misturar às facções políticas ou às festividades populares, eles eram considerados inimigos de prosperidade do Estado e a causa de todas as calamidades. Chegamos agora a uma mudança completa de governo - um governo que afligiu toda a igreja de Deus.

Os Primeiros Edifícios Públicos para Assembleias Cristãs

Um importante ponto na história da igreja, e que prova sua posição alterada no Império Romano, agora aparece diante de nós pela primeira vez. Foi durante o reinado desse excelente príncipe (Alexandre Severo) que as primeiros edifícios públicos foram levantados para as assembleias de cristãos. Uma pequena circunstância conectada a uma pequena porção de terra em Roma mostra o verdadeiro espírito do imperador e o crescente poder e influência dos cristãos. Esse terreno, considerado de uso geral, foi escolhido por uma congregação como o lugar para uma igreja, mas uma companhia de abastecedores reivindicava que tinha prioridade sobre o uso do terreno. O caso foi julgado pelo imperador, que decidiu conceder o terreno aos cristãos, sob a alegação de que era melhor dedicá-lo à adoração a Deus em qualquer forma do que aplicá-lo a um uso profano e indigno.

Edifícios públicos - chamadas de "igrejas cristãs" - começavam agora a aparecer em diferentes partes do império, e a possuir propriedades na terra. Os pagãos nunca conseguiam entender porque os cristãos não tinham templos nem altares. Suas assembleias religiosas, até essa época, eram realizadas de modo privado. Até mesmos os judeus tinham suas sinagogas públicas, mas os cristãos não se reuniam em algum edifício separado e distinto. A casa particular, as catacumbas, o cemitério de seus mortos, eram os lugares em que ocorriam suas pacíficas congregações. A  privacidade deles, que muitas vezes era, naqueles turbulentos tempos, sua segurança, estava agora passando. Por outro lado, deve também ser observado que essa confidencialidade era muitas vezes utilizada contra eles. Nós vimos como, no princípio, os pagãos não conseguiam entender uma religião sem um templo, e então eram facilmente persuadidos de que essas reuniões privadas e misteriosas, que pareciam evitar a luz do dia, serviam apenas para o pior dos propósitos.

A condição exterior do cristianismo estava agora mudando de maneira incrível - mas infelizmente, não em favor da saúde e crescimento espiritual, como veremos em breve. Havia agora edifícios bem conhecidos nos quais os cristãos se reuniam, cujas portas podiam ficar bem abertas para toda a gente. O cristianismo era agora reconhecido como uma das várias formas de adoração que o governo não proibia. Mas a tolerância aos cristãos durante este período teve o apoio favorável apenas de Alexandre. Nenhuma mudança foi feita nas leis do império em favor dos cristãos, de modo que seu tempo de paz teria um fim com a morte do imperador. Uma conspiração foi formada contra ele pela desmoralizada soldadesca, que não podia suportar a disciplina que o imperador procurava restaurar. E assim o jovem imperador foi morto em seu quarto, aos vinte e nove anos de idade e no décimo terceiro ano de seu reinado.

A Posição Alterada do Cristianismo na Sociedade

Após a morte de Septímio Severo - exceto durante o curto reinado de Maximino - a igreja desfrutou de uma temporada de relativa paz até o reinado de Décio, no ano 249 d.C. Porém, durante o favorável reinado de Alexandre Severo, uma mudança considerável aconteceu na relação do cristianismo com a sociedade. Por toda a sua vida, Alexandre esteve sob a influência de sua mãe, Julia Mamea, que é descrita por Eusébio como "uma mulher distinta por sua piedade e religiosidade." Ela chamou Orígenes, sobre cuja fama ela tinha ouvido falar muito, e aprendeu dele algo sobre as doutrinas do evangelho. Ela se tornou, mais tarde, favorável aos cristãos, mas não há muitas evidências de que ela também tenha sido cristã.

Alexandre tinha uma disposição religiosa. Ele tinha muitos cristãos em sua casa, e bispos eram admitidos até mesmo na corte em caráter reconhecidamente oficial. Ele frequentemente usava as palavras de nosso Salvador: "E como vós quereis que os homens vos façam, da mesma maneira lhes fazei vós, também." (Lucas 6:31). Ele tinha essas palavras escritas nas paredes de seu palácio e em outros edifícios públicos. Mas todas as religiões eram consideradas para ele como quase a mesma coisa, e sobre este princípio ele deu ao cristianismo um lugar em seu eclético sistema.

domingo, 10 de abril de 2016

Perpétua e Seus Companheiros

Dentre outros que foram presos e martirizados na África durante essa perseguição, Perpétua e seus companheiros, dentre todas as histórias, merecem um lugar distinto. A história do martírio deles não só carrega todo o selo dessa verdade circunstancial, como também está repleta de toques mais requintados de sentimento e afeição natural. Aqui vemos a bela combinação dos mais ternos sentimentos e dos mais fortes afetos que o cristianismo reconhece em todos os seus direitos, e os torna ainda mais profundos e ternos porque foi a causa do sacrifício deles sobre o altar da total dedicação àquEle que morreu em total dedicação a nós. "O qual me amou", como diz a fé, com propriedade, "e se entregou a si mesmo por mim." (Gálatas 2:20)

Em Cartago, no ano 202, três jovens homens, Revocato, Saturnino e Secundulo, e duas moças, Perpétua e Felicidade, foram presos, todos eles sendo ainda catecúmenos, isto é, novos convertidos que se preparavam para o batismo e comunhão. Perpétua era de boa família, rica e nobre, de educação liberal, e honrosamente casada. Ela tinha cerca de 22 anos de idade, e era mãe de um bebê ainda de peito. Toda sua família aparentemente era cristã, com exceção de seu pai, que ainda era pagão. Nada é dito sobre seu marido. Seu pai era muito apegado a ela, e temia muito a desgraça que seus sofrimentos por Cristo trariam para sua família. Assim ela tinha de lutar não apenas com a morte em sua forma mais terrível, mas também com todo laço sagrado da natureza.

Quando ela foi levada pela primeira vez perante seus perseguidores, seu velho pai veio e pediu que ela se retratasse e dissesse que não era cristã. "Pai", ela respondeu calmamente, apontando para um vaso que estava no chão, "poderia eu chamar esse vaso de qualquer coisa além do que ele é?" "Não", ele respondeu. "Assim também eu não poderia te dizer nada além do que eu sou, uma cristã." Alguns dias depois, os jovens cristãos foram batizados. Apesar de estarem sob guarda, eles não estavam ainda presos na prisão. Mas pouco tempo depois disto, eles foram lançados na masmorra. "Então", ela disse, "eu fui tentada, estava apavorada, pois eu nunca tinha estado em tal escuridão antes. Oh, que dia terrível! O calor excessivo ocasionado pelo número de pessoas, o duro tratamento dos soldados, e, finalmente, a ansiedade por causa do meu bebê, me tornou miserável." Os diáconos, no entanto, conseguiram adquirir para os prisioneiros cristãos um lugar melhor, onde ficavam separados dos criminosos comuns. Tais vantagens podiam geralmente ser adquiridas dos corruptos supervisores das prisões. Perpétua estava agora feliz por ter seu filho consigo. Ela o pegou no colo e exclamou: "Agora, esta prisão se tornou um palácio para mim!".

Após alguns dias houve um rumor de que os prisioneiros seriam examinados. O pai apressou-se até sua filha em grande aflição de espírito. "Minha filha", disse ele, "tenha pena de meus cabelos grisalhos, tenha pena do seu pai, se ainda sou digno de ser chamado seu pai. Se eu a eduquei até a flor da sua juventude, se eu preferi você a todos os seus irmãos, não me exponha a tal vergonha entre os homens. Olhe para o seu bebê - seu filho que, se você morrer, não poderá sobreviver por muito tempo. Deixe seu espírito elevado de lado, para que todos nós não mergulhemos em ruínas. Pois se você morrer, então nenhum de nós jamais terá coragem de falar livremente de novo." Enquanto ele falava isto, ele beijou suas mãos, se lançou a seus pés, suplicando-lhe com termos carinhosos e muitas lágrimas. Mas, embora muito comovida e aflita pela visão do seu pai e sua forte e terna afeição por ela, ela ficou calma e firme, e sentiu-se principalmente preocupada pelo bem de sua alma. "Os cabelos grisalhos de meu pai", disse ela, "me afligem ao considerar que apenas ele da minha família não se regozijaria com meu martírio." "O que acontecerá", disse-lhe ela, "quando eu chegar perante o tribunal, depende da vontade de Deus, pois não permanecemos em pé por nossa própria força, mas apenas pelo poder de Deus."

Ao chegar a hora decisiva - o último dia do julgamento deles - uma imensa multidão se reuniu. O velho pai novamente apareceu, na esperança de poder, pela última vez, mudar a ideia de sua filha. Nesta ocasião ele levou seu neto recém-nascido em seus braços, e pôs-se diante dela. Que momento! Que espetáculo! Seu velho pai, seus cabelos grisalhos, seu tenro bebê: que apelo para uma filha - para o coração de uma jovem mulher! "Tenha pena dos cabelos grisalhos de seu pai", disse o governador, "tenha pena de sua criança indefesa, e ofereça sacrifício em prol da prosperidade do imperador." Assim ela se apresentou perante o tribunal, perante a multidão reunida, perante as admiradas miríades dos céus, perante as tenebrosas hostes do inferno. Mas Perpétua estava calma e firme. À semelhança de Abraão, pai dos que creem, seus olhos não estavam agora em seu filho, mas no Deus da ressurreição. Tendo encomendado seu filho aos cuidados de sua mãe e de seu irmão, ela respondeu ao governador, e disse: "Isto não posso fazer." "Você é cristã?", ele perguntou. "Sim", ela respondeu, "sou cristã". Seu destino estava agora decidido. Eles foram todos condenados a servirem de cruel entretenimento para o povo e os soldados, em uma luta com feras selvagens, na festa de aniversário do jovem Geta, filho mais novo do imperador. Eles retornaram a suas masmorras, regozijando por terem sido capazes de testemunharem e sofrerem por amor a Cristo. O carcereiro, Pudas, foi convertido por meio do comportamento tranquilo dos prisioneiros.

Quando foram levados ao anfiteatro, os espectadores notaram que os mártires tinham uma aparência pacífica e alegre. De acordo com um costume que prevalecia em Cartago, os homens deviam ser vestidos de escarlate como os sacerdotes de Saturno, e as mulheres de amarelo como as sacerdotisas de Ceres, mas os prisioneiros protestaram contra tal procedimento. "Viemos aqui", disseram, "por nossa própria escolha, e não deixaremos que nossa liberdade seja tirada de nós; nós desistimos de nossas vida para não sermos forçados a tais abominações." Os pagãos reconheceram que o pedido deles era justo, e cederam. Após se despedirem entre si com o mútuo beijo do amor cristão, com a esperança certa de logo se encontrarem novamente, estando "fora do corpo, para habitar com o Senhor" (2 Co 5:8), eles foram adiante para a cena de morte em seus trajes simples. A voz de louvor a Deus foi ouvida pelos espectadores. Perpétua estava cantando um salmo. Os homens foram expostos a leões, ursos e leopardos; as mulheres foram atiradas a uma vaca furiosa. Mas todos foram rapidamente libertados de seus sofrimentos pela espada do gladiador, e entraram na alegria do seu Senhor.

A interessante narrativa aqui resumida, e que supõe-se ter sido escrita pelas próprias mãos de Perpétua {* N. do T.: obviamente até o momento anterior ao seu martírio}, respira tal ar de verdade e realismo que conquistou o respeito e confiança de todas as eras. Mas o nosso principal objetivo ao escrevê-la para nossos leitores é apresentá-los a uma imagem viva na qual muitas das melhores qualidades da fé cristã estão belamente mescladas com os mais calorosos e ternos sentimentos cristãos, e para que possamos aprender a não sermos reclamões e murmuradores, mas a suportar todas as coisas por amor de Cristo, para que Sua graça possa brilhar, nossa fé triunfar, e Deus ser glorificado.

Alguns anos após esses eventos, Severo voltou sua atenção para a Grã-Bretanha, onde os romanos estiveram perdendo terreno. O imperador, estando à frente de um exército muito poderoso, rechaçou os nativos independentes da Caledônia, e reconquistou a região ao sul da muralha de Antonino, mas perdeu tantas tropas nas sucessivas batalhas em que foi obrigado a lutar que não achou apropriado forçar suas conquistas além daquele limite. Sentindo o tempo de seu fim se aproximando, ele se retirou para York, onde logo expirou, no décimo oitavo ano de seu reinado, em 211 d.C.

A Perseguição na África

Os historiadores dizem que em nenhuma parte do Império Romano o cristianismo tinha criado raízes mais profundas e permanentes do que na província da África. Naquela época, essa região era cheia de ricas e populosas cidades. O tipo africano de cristianismo era totalmente diferente do que era chamado de cristianismo egípcio. O primeiro era mais sincero e apaixonado, e o último era sonhador e especulativo, graças à má influência do platonismo. Tertuliano pertence a este período, e é um verdadeiro exemplo desta diferença; mas veremos mais sobre isso mais adiante. Vamos agora tomar nota de alguns dos mártires africanos.

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